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Orações periféricas #1: Racionais Mc’s

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Orações periféricas #1: Racionais Mc’s

Orações periféricas #1: Racionais Mc’s

Por meio dos poetas marginais desse Brasil, misturamos ritmo com uma pitada de fé, seja ela qual for. Aqui, o Rap é lido como um dia foi sentido. Ou mesmo, é arrepio de uma alma vagabunda, da qual se lê, mesmo sem saber. Sensação de escrita, sensação do som, sensação do céu. Assim é o Mistério ancestral que jogado à água salgada, nos brinda com uma bebida doce e amarga, banana com denúncia, Oshun e Iemanjá, Hare Cristo.

“Ritmo e Poesia e Mística” é um projeto semanal onde a oração, a prece, o ponto e a reza da rua, se apresentam em comunhão com a vida, cultura e política das periferias do Brasil.

Jesus chorou

O que é, o que é?
Clara e salgada,
Cabe em um olho e pesa uma tonelada Tem sabor de mar,
Pode ser discreta
Inquilina da dor,
Morada predileta
Na calada ela vem,
Refém da vingança,
Irmã do desespero,
Rival da esperança.
Pode ser causada por vermes e mundanas
E o espinho da flor,
Cruel que você ama
Amante do drama, Vem
pra minha cama
Por querer, sem me perguntar me fez sofrer E
eu que me julguei forte,
E eu que me senti,
Serei um fraco quando outras delas vir
Se o barato é louco e o processo é lento,
No momento,
Deixa eu caminhar contra o vento

Do que adianta eu ser durão e o coração ser vulnerável?
O vento não, ele é suave, mas é frio e implacável
(É quente) Borrou a letra triste do poeta
(Só) Correu no rosto pardo do profeta
Verme sai da reta,
A lágrima de um homem vai cair,
Esse é o seu B.O. pra eternidade
Diz que homem não chora,
Tá bom, falou,
Não vai pra grupo irmão aí,
Jesus chorou!

(Album: Nada como um dia após o outro dia, 2002. Trecho da música: Jesus Chorou)

Considerado o maior grupo de rap do país, desde 1988 Racionais Mc’s escreve o seu nome na história brasileira. Sua representatividade junto à militância em diversas décadas, sua “voz ativa” no combate aos desmandos do estado bem como sua denúncia contundente sobre o racismo estrutural, continuam mais vivos do que nunca.

A mais recente notícia em relação ao grupo – além da turnê de comemoração dos 30 anos de carreira – foi o lançamento do livro “Sobrevivendo no Inferno”, pela editora Companhia das Letras, que reúne as músicas do álbum de mesmo nome, lançado em 1997. Essa notícia gerou polêmica após ter sido anunciado pela Unicamp, como uma das leituras obrigatórias para a realização do vestibular da instituição.

Os Racionais Mc’s colecionam inúmeros prêmios, polêmicas e álbuns: “Holocausto urbano” (1990), “Escolha seu caminho” (1992), “Raio X do Brasil” (1993), “Sobrevivendo no inferno” (1997), “Nada como um dia após o outro dia” (2002) e “Cores e Valores” (2014). Sua poesia é real, é periférica, é profética. Seu sagrado tem um lado: “Vigia os ricos, mas ama os que vem do gueto”. Racionais Mc’s tem cor, assim como o Jesus professado também tem: negro.

* Texto adaptado do artigo “Letramentos periféricos: O Jesus negro dos Racionais Mc’s”, de Bruno Rocha. – https://medium.com/instituto-mosaico/letramentos-perif%C3%A9ricos-o-jesus-negro-dos- racionais-mcs-5e5bee31f8fa

Mestrando em Ciências da Religião pela Universidade Metodista de São Paulo (UMESP), teólogo pela Faculdade Teológica Batista de São Paulo e ator, especializado em comédia física e palhaçaria.

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