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Orações periféricas #5: Djonga

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Orações periféricas #5: Djonga

Orações periféricas #5: Djonga

Por meio dos poetas marginais desse Brasil, misturamos ritmo com uma pitada de fé, seja ela qual for. Aqui, o Rap é lido como um dia foi sentido. Ou mesmo, é arrepio de uma alma vagabunda, da qual se lê, mesmo sem saber. Sensação de escrita, sensação do som, sensação do céu. Assim é o Mistério ancestral que jogado à água salgada, nos brinda com uma bebida doce e amarga, banana com denúncia, Oshun e Iemanjá, Hare Cristo. “Ritmo e Poesia e Mística” é um projeto semanal onde a oração, a prece, o ponto e a reza da rua, se apresentam em comunhão com a vida, cultura e política das periferias do Brasil.

Olho de Tigre

Um boy branco, me pediu um high five
Confundi com um Heil, Hitler
Quem tem minha cor é ladrão
Quem tem a cor de Eric Clapton é cleptomaníaco
Na hora do julgamento, Deus é preto e brasileiro
E pra salvar o país cristão e ex-militar
Que acha que mulher reunida é puteiro

Machista, tá osso
E até eu que sou cachorro não consigo mais roer
Esse castelo vai ruir
Eles são fracos, vão chorar até se não doer
Não queremos ser o futuro, somos o presente
Na chamada a professora diz: Pantera Negra
Eu respondo: Presente!

Eu vou

Jesus se manifesta disfarçado
Ignoram verdades e aplaudem mentiras
Imagino o Djonga, Jesus de disfarçado
O tempo tá uma bagunça, por isso só mostro a ira
Só sei que foi assim, uma noite qualquer
Quando todos dormiam, os irmão roubou comida
Umas galinha e quatro dente de alho
Tira de quem tem dente de ouro
E dá pra quem precisa, segue a cena
O povo alimentado saiu da caverna
Enxergou a luz e atacaram os poderosos
Que já tavam preparados, porcos nojentos
Deixaram geral vivo e mataram os dois de exemplo
Mas morrer por tá certo? Meu Deus, cadê você?
Eu vou ser personagem de história sem fim feliz?
O meu maior pecado é num entender qual que é a do mundo
Coisas do tipo: Por que mulher de short é meretriz?

Fonte: Projeto “Perfil: 22”, 2017. Trecho da música: Olho de Tigre; Hot e Oreia (Part. Djonga). Álbum Rap de Massagem, 2019. Trecho da música: Eu vou.

 

Djonga é um rapper mineiro que apareceu no cenário nacional através do grupo Dv Tribo, em 2016. Nesse mesmo ano, uma parceria entre vários Mc’s – “Poetas no topo 1” – mostrou que o jovem, na época de 22 anos, possuía uma mistura de “gangsta” rap e irreverência, que o grande público concentrado em São Paulo e Rio de Janeiro desconhecia. Novamente em outra parceria (Atletas do Ano, 2017), aquela seria o prenúncio de 4 anos consecutivos de lançamentos, onde o rap nacional finalmente conheceria as outras ideias que ecoavam na cabeça do rapper: “Heresia, 2017”, “O menino queria ser Deus, 2018”, “Ladrão, 2019” e “Histórias da minha área, 2020”.

As mídias sociais fazem parte da história do crescimento de vários Mc’s desse tempo e através delas, pode-se observar o crescimento, as críticas e os embates. Coincidência ou não, a música “Sulicídio”, lançada em 2016 pelos Mc’s Baco Exu do Blues e Diomedes Chinaski, ambos nordestinos, abriu caminhos para outros estados conquistarem o seu lugar e serem reconhecidos fora do principal eixo cultural nacional (Rio/São Paulo). A música de Djonga é crítica, insurgente, ancestral e espiritual. Nos brinda com uma sensibilidade respeitosa com os mais velhos e com os seus orixás. São Jorge, Iemanjá, Jesus Cristo compõe o imaginário desse Mc que, por ser profeta como Cristo, o “coroaram com espinhos” (Corre das Notas, 2017).

 

Mestrando em Ciências da Religião pela Universidade Metodista de São Paulo (UMESP), teólogo pela Faculdade Teológica Batista de São Paulo e ator, especializado em comédia física e palhaçaria.

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